A confusão de bicos pode ser um processo desafiador tanto para a mãe quanto para o bebê, impactando diversos aspectos, desde o fisiológico até o emocional. Muitas vezes, os sinais são sutis e passam despercebidos até que o problema se torne mais grave. Quanto mais tempo se demora para identificar a confusão de bicos, maior será o esforço necessário para restabelecer a amamentação. Por isso, antes de introduzir chupetas ou mamadeiras, é importante considerar alguns pontos. 

Não há evidências de que o uso de bicos artificiais favoreça a amamentação. Pelo contrário, há muitos estudos que mostram que eles podem causar problemas significativos. Não existe uma quantidade “segura” ou uma idade “ideal” para oferecer bicos artificiais. Qualquer bebê que usa chupeta, mamadeira, chuquinha ou bico de silicone pode experimentar confusão de bicos. A boa notícia é que, se identificada a tempo, é possível reverter a situação e recuperar a amamentação. 

A confusão de bicos é um tema amplamente estudado há muitos anos e tem impactos significativos na saúde e desenvolvimento de mães e bebês. Pesquisas em diversas áreas, como fonoaudiologia, odontopediatria e pediatria, indicam que o uso de chupetas e outros bicos artificiais pode ser altamente prejudicial para a qualidade e duração da amamentação, além de interferir no desenvolvimento natural das estruturas ósseas e musculares da face do bebê, contribuindo para hábitos de respiração oral. Apesar de ter recebido mais atenção recentemente, o tema ainda é subestimado por muitas mães e, infelizmente, por alguns profissionais da saúde. 

Quando seu filho usa uma chupeta ou qualquer outro bico artificial, ele utiliza uma musculatura diferente daquela usada ao mamar no seio. A musculatura usada para segurar a chupeta é mais parecida com a que usamos para assobiar, com os músculos bucinadores sendo os mais ativados. A língua fica quase sem função, posicionada atrás da gengiva, realizando apenas movimentos de elevação para pressionar o bico contra o palato. Em contraste, ao mamar no seio, o bebê utiliza a musculatura usada para mastigar, além de todos os músculos da língua, o que permite um movimento coordenado e complexo que cria o vácuo necessário para extrair o leite, estimulando continuamente o palato mole para a ejeção do leite.

Quais as consequências?  

A principal consequência dessa diferença é a perda da pega correta e, gradualmente, a diminuição da força de sucção ao seio devido à falta de uso da musculatura apropriada. Isso pode levar a mamadas mais curtas, cansaço, sonolência durante a amamentação e tentativas frustradas de conseguir a pega correta, resultando em menor estímulo ao seio e, consequentemente, uma redução na produção de leite materno. Com o tempo, se nada for feito, o uso da chupeta pode aumentar, pois o bebê pode ficar irritado ou solicitar mamadas mais frequentes (muitas vezes confundidas com cólicas), o que pode levar a um uso ainda maior da chupeta. Isso reduz ainda mais o estímulo ao seio e, em casos mais graves, pode comprometer o ganho de peso do bebê, levando à introdução de leite artificial e tentativas muitas vezes infrutíferas (e às vezes perigosas) de aumentar a produção de leite materno de forma artificial.  

A parte mais difícil da confusão de bicos ocorre quando o bebê perde a conexão emocional associada à amamentação. A chupeta acaba substituindo as sensações de conforto, consolo, proteção e segurança que o bebê deveria encontrar no seio da mãe. Muitos bebês nessa fase podem parar de adormecer no seio e chorar pedindo a chupeta para dormir. Eles podem resistir quando a mãe tenta amamentá-los e, em fases mais avançadas da confusão de bicos, podem até mostrar sinais de ânsia de vômito ao tentar mamar. Algumas mães interpretam isso como rejeição, mas isso acontece devido à sensibilização precoce do palato mole pelo uso contínuo da chupeta. 

Quais os sinais? 

Se o seu bebê, independentemente da idade, faz uso de chupeta ou mamadeira, é importante observar alguns sinais que podem indicar confusão de bicos: 

• Morde o seio ao iniciar a mamada: O bebê abre pouco a boca e tenta pegar o seio como faria com uma mamadeira, causando mordidas no início da mamada. 

• Mordidas durante a sucção não nutritiva: Ao querer apenas relaxar no seio, o bebê empurra o mamilo com a língua e pode mordê-lo, como se estivesse sugando uma chupeta. 

• Cansa rapidamente quando o fluxo diminui: O bebê para de mamar quando o seio está flácido e o fluxo de leite diminui, mas pode continuar por mais um tempo com compressão da mama. 

• Irritação com o fluxo baixo: Fica irritado quando o leite diminui, sugere cansaço, mas ainda quer mamar, levando você a oferecer complemento. 

• Não adormece no peito: Fica inquieto e só se acalma com uma chupeta em vez de adormecer no seio. 

• Aumento da suplementação com fórmula: Você tem oferecido mais fórmula, passando de 90 mL em algumas mamadas. 

• Recusa o seio quando acordado: O bebê prefere a mamadeira ao seio quando está acordado, mas mama bem quando sonolento. 

• Dificuldade de mamar à noite: O bebê não se satisfaz mais apenas com o peito durante a noite e precisa de fórmula ou chupeta para dormir. 

• Dificuldade ao iniciar a mamada: O bebê fica agitado, chora, e solta o seio várias vezes antes de conseguir uma pega correta. 

• Desconforto e sensibilidade no seio: Seu peito está mais sensível e machucado, especialmente se o bebê adormece no seio, e ele perde a pega facilmente durante a sucção não nutritiva. 

O que fazer para reverter?  

A solução é mais simples do que parece: melhorar a qualidade da amamentação, removendo a chupeta, fortalecendo a musculatura oral, corrigindo a pega e aumentando a frequência das mamadas. Para reverter a confusão de bicos, o primeiro passo é restabelecer o vínculo entre o bebê e o seio. A seguir, algumas dicas para ajudar a evitar que o bebê abandone o seio definitivamente: 

• Interrompa o uso de bicos artificiais: Substitua a chupeta pelo seio sempre que o bebê quiser sugar para conforto. Se necessário, retire os bicos gradualmente para não sobrecarregar o bebê e preserve o descanso dele. Se usar fórmula, ofereça-a após o seio com copinho ou colher. 

• Aumente o contato físico e colo: Fortaleça o vínculo afetivo com o bebê através de contato pele a pele, colo, e outras formas de aconchego. Não force o bebê a mamar; ele precisa redescobrir o peito como fonte de conforto naturalmente. 

• Ofereça o seio quando o bebê estiver sonolento: Amamente quando o bebê estiver quase dormindo ou acordando, pois ele pode estar mais receptivo. Use técnicas como compressão da mama para prolongar a mamada. 

• Estabeleça uma rotina adequada: Organize uma rotina que inclui alimentação, estímulo e descanso. Um bebê bem descansado é mais paciente e pode se reaproximar do seio mais facilmente. Inclua contato pele a pele para fortalecer o vínculo. 

• Varie o ambiente e as posições de amamentação: Tente amamentar em locais e posições diferentes para tornar o momento mais agradável e menos estressante para você e o bebê. 

• Opte pela amamentação em livre demanda: Amamente sempre que o bebê mostrar sinais de fome, sem seguir horários rígidos. Isso ajuda a garantir que o bebê esteja recebendo leite suficiente diretamente do peito. 

• Monitore a pega e a sucção: Observe a forma como o bebê pega o peito e suga. Se notar qualquer dificuldade, ajuste a posição ou busque orientação para garantir que a amamentação seja eficaz e confortável para ambos. 

• Busque ajuda profissional se necessário: Se você precisar complementar o seu bebê, busque ajuda profissional de uma consultora em aleitamento materno, existem diversas outras maneiras de oferecer esse complemento sem a necessidade da mamadeira! 

Uma Escolha Consciente 

Entre as crianças amamentadas que usam chupeta, apenas 40% continuam a ser amamentadas até os 6 meses, menos de 30% ultrapassam os 12 meses e apenas cerca de 12% chegam aos 15 meses¹. Então, para quem se pergunta se é possível amamentar enquanto o bebê usa chupeta, a resposta é sim, até certo ponto. Mas por quanto tempo seu filho conseguirá manter essa combinação? Não há como prever, pois a confusão de bicos é imprevisível. Não há garantia de que seu bebê estará entre os 30% que conseguem passar de um ano ou entre os 70% que acabam desmamando precocemente. 

Optar por oferecer uma chupeta é uma decisão individual de cada mãe, mas não podemos mais ignorar as evidências sobre os impactos negativos dos bicos artificiais na amamentação. Compreender as possíveis consequências torna essa escolha mais informada. Se você decidiu oferecer uma chupeta ou mamadeira por qualquer motivo e ainda quer continuar amamentando, é importante estar atenta aos sinais de confusão de bicos e agir antes que a situação se agrave. 

Saiba mais neste guia da Sociedade Brasileira de Pediatria sobre o uso de chupeta em crianças amamentadas: prós e contras

Fonte: The Effects of Early Pacifier Use on Breastfeeding Duration. Pediatrics March

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